05 Apr Musicoterapia: “Música ou Terapia?”
Desde cedo, a música e os elementos sonoro-musicais entram em relação com o desenvolvimento do ser humano. No período intrauterino a música e os elementos sonoro musicais são considerados um dos elos mais consistentes de relação do feto com o mundo exterior e com a própria mãe. Os elementos sonoro-musicais continuam como importantes estímulos contributivos no desenvolvimento da criança ao longo de todo o seu percurso evolutivo.
Ainda no período fetal, o feto já recebe os estímulos exteriores sonoros e musicais. Alguns autores, como Pocinho (1999), convencidos da influência determinante da música sobre o feto, chegaram a preconizar uma educação pré-natal, onde propõem que as senhoras grávidas ouçam frequentemente música de que gostem e que façam exercícios rítmicos. A ideia defensora de que o feto é recetivo e reativo aos sons exteriores não é recente. Mog (citado por Sousa, 2003), refere um estudo de Stirnimann (1940) em que este demonstra que os bebés, no útero da mãe, respondem com movimentos bruscos aos estímulos musicais.
São vários os estudos (Bruscia, 1999; Descaper & Spencer, 1986; Kisilevsky, Hains, Lee, Xie, Huang, Ye, Zhang & Wang, 2003; Krueger, 2010; Sá, 2003) que comprovam a importância dos elementos sonoro-musicais, no desenvolvimento do ser humano ao longo da vida. A ambiguidade das caraterísticas destes elementos permite que estes possam ser de cariz terapêutico, ou não, e serem utilizados no desenvolvimento ou manutenção de competências, podendo chegar a cada nível de desenvolvimento mais específico, e adequar-se às características de variados diagnósticos.
Varias pesquisas desenvolvidas nesta área têm demonstrado que a música tem influência e estabelece uma relação direta com o organismo humano (Gordon, 2000; Sacks, 2008) possibilitando, entre outras coisas, avaliar o crescimento físico, psicológico e emocional do indivíduo (Pocinho, 1999), desempenhando um papel importante no desenvolvimento de competências musicais e não musicais na criança com necessidades educativas especiais (Norddof-Robbins, 1965, Ockelford, 2000, Welch et al., 2001).
Contudo, atualmente, dada a crescente procura por este tipo de intervenção terapêutica e a diversidade de oferta, talvez não seja surpreendente que exista uma falta de esclarecimento sobre alguns conceitos centrais diretamente relacionados com a intervenção nesta área, nomeadamente, o que pode ser considerado como musicoterapia, em oposição à educação musical, e quem é o musicoterapeuta? A visão predominante parece ser a de que a musicoterapia é o termo apropriado para classificar as atividades musicais estruturadas realizadas com todo o tipo de população em questão. E o musicoterapeuta, é classificado como qualquer profissional que toque um instrumento musical e dinamize pequenos e grandes grupos populacionais, independentemente de ter ou não conhecimento superior específico sobre as condições diagnósticas dos mesmos.
Segundo Silva (1997), a expressão musical assenta num trabalho de exploração de sons e ritmos, que o indivíduo produz e explora espontaneamente e que vai aprendendo a identificar e a produzir, com base num trabalho sobre os diversos aspetos que caracterizam os sons: intensidade (fortes e fracos), altura (graves e agudos), timbre (modo de produção), duração (sons longos e curtos), chegando depois à audição interior, ou seja, a capacidade de reproduzir mentalmente fragmentos sonoros.
Por sua vez, a definição de Musicoterapia que atualmente vigora, é a da World Federation of Music Therapy (2011) que, define a Musicoterapia como sendo a utilização da música e/ou de seus elementos (som, ritmo, melodia e harmonia) por um musicoterapeuta qualificado com um cliente ou grupo, em um processo para facilitar e promover a comunicação, relação, aprendizagem, mobilização, expressão, organização e outros objetivos terapêuticos relevantes, no sentido de alcançar necessidades físicas, emocionais, mentais, sociais e cognitivas.
A musicoterapia é o uso de sons organizados e de música na perspetiva da evolução do relacionamento entre cliente e terapeuta, com a finalidade de apoiar e incentivar o bem-estar físico, mental, social e emocional (Bunt,1994).
O musicoterapeuta, consiste num profissional habilitado academicamente para o exercício desta profissão, que exige no mínimo e em início de carreira, formação de nível superior, tal como, um Mestrado em Musicoterapia.
Muitos autores têm vindo a estudar os efeitos terapêuticos da música. Desde que se conhece este fenómeno que se vão relatando casos bastante pertinentes para a melhoria do conhecimento sobre a música no desenvolvimento humano e na relação com as suas emoções. A relação e o impacto direto da música no organismo humano, tem suscitado interesse e sido motivo de descobertas e progressos científicos em determinadas especialidades e áreas científicas, tais como a neurologia, a geriatria e diagnósticos demenciais e degenerativos, perturbações de desenvolvimento, entre outros…onde por vezes, é associada de forma complementar a outro tipo de intervenção.
Atualmente, a musicoterapia tem um desenvolvimento significativo em diversos países, especialmente em áreas relacionadas com as síndromes genéticas como Down, Turner e Rett, distúrbios neurológicos, distúrbios emocionais, deficiências sensoriais, visuais e auditivas, autismo, entre outras. Esta causa efeitos bio-psico-sociais no desenvolvimento do ser humano, tais como: bem-estar, ativação do tónus muscular, influência na frequência cardíaca, pressão sanguínea e todo o sistema nervoso autónomo, desenvolvimento do raciocínio lógico-matemático, desenvolvimento da sensibilidade e da capacidade percetiva (promove alterações no impacto dos estímulos sensoriais de diferentes modos), da autoestima, da capacidade de expressão e comunicação, da coordenação motora, expressão corporal, competências sociais, entre outros.
A musicoterapia é assim uma disciplina de cariz científico, e um tipo de intervenção terapêutica de carácter sistematizado, que pode intervir de forma complementar ou principal em processos de desenvolvimento, manutenção ou reabilitação da condição de saúde do indivíduo.
Este tipo de intervenção possibilita um enquadramento não-verbal, através do qual as pequenas diferenças de comportamento se tornam evidentes nos processos intra ou inter pessoais, como por exemplo, em indivíduos com perturbações da relação e da comunicação. Essas diferenças podem ser encontradas no comportamento musical. O musicoterapeuta pode a este nível contribuir para a avaliação e diagnóstico global dos pacientes em musicoterapia ao nível da avaliação específica das capacidades sensoriomotoras, cognitivas (atenção, memória, jogos de antecipação e sequência lógica) perceção visual e auditiva e comunicação interpessoal.
Em Musicoterapia, existe um plano terapêutico, elaborado pelo musicoterapeuta, em consonância, ou não, com os técnicos da equipa multidisciplinar. Os objetivos gerais variam de acordo com as características do grupo ou indivíduo, suas necessidades e peculiaridades.
Independentemente das necessidades provenientes de cada patologia, a Musicoterapia valoriza a expressão de cada indivíduo, respeitando as suas particularidades e auxiliando-o nas suas dificuldades, como um ser global.
Em modo conclusivo, e em resposta ao título inicial do artigo, imagine-se assim o recurso do potencial da utilização da música associado a um terapeuta devidamente especializado.
Rita Maia, Pessoalmente ®
Esperemos que tenha gostado e que o tema possa servir curiosas reflexões, bem como explorações internas/ externas!
Partilhe com (ou identifique no texto) todas as pessoas que possam beneficiar com este artigo.
Comente ou deixe-nos sugestões sobre musicoterapia ou tópicos relacionados. Todos os contributos muito bem vindos!