16 Jan Do Solstício de Inverno ao longo mês de Janeiro: a ressaca emocional
Eu sempre atribui cores aos meses e para mim o mês de Janeiro sempre foi o mês branco. Mas esta minha atribuição aleatória de cores aos meses ganhou um significado mais substanciado quando em 2014 foi iniciado um movimento global de consciencialização sobre temas da saúde mental. Janeiro Branco passou a ser mais um mês onde alertamos para a necessidade de cuidar da nossa saúde (mental). Ao longo destes anos de psicoterapeuta, os relatos que mais oiço de Janeiro é de ser muito longo e muito difícil – “este mês nunca mais acaba”.
Em Janeiro parece que, finalmente, o Inverno instala-se e sente-se; mas sente-se não só no frio das temperaturas, sente-se na forma como as pessoas “se emocionam”. O mês de Janeiro não é mais longo do que outros meses, mas carrega muitas vezes o peso de ser o primeiro do ano novo e de ser o primeiro após uma época cheia… cheia de cores e luzes, ainda que nem sempre, para todos, com o brilho almejado. O mês de Janeiro é o primeiro mês após estímulos intensos, atividades intensas, interações sociais intensas, pelo que começa muitas vezes já cansado, exausto ou mesmo letárgico e deprimido.
Para uns a sensação de vazio emocional, apatia, a sensação de falta, geralmente de ânimo, afeto, atenção, reconhecimento ou cuidado, mas também de significado(s) na vida. Para outros, a desconexão com as pessoas à volta, a experiência de isolamento emocional, mesmo quando não se está fisicamente sozinho. Ou então, a dificuldade em confiar nos outros, medo de rejeição e desafios na formação e manutenção de relacionamentos saudáveis, que resultam em grandes crises de ansiedade… são algumas das partilhas deste “longo mês”.
Infelizmente, não existem receitas mágicas para curar as feridas do nosso crescimento e desenvolvimento enquanto seres humanos. É preciso estar com estas feridas e sará-las. Permitir um entendimento mais profundo de nós mesmos, das nossas necessidades emocionais e praticar autocuidado (tempo para descansar, recuperar e relaxar) serão sempre os primeiros passos para lidar com os desafios psicológicos. Trabalhar na construção de relações interpessoais saudáveis, baseadas na confiança e na comunicação… os passos seguintes.
Como permitimos um maior entendimento de nós mesmos? Comecemos pelas crenças. Todos nós nos regemos por crenças e pensamentos que podem ser rígidos, negativos e até muitas vezes distorcidos face a nós, aos outros e ao mundo – “não sou capaz”, “não sou amável”, “sou fraco”, “não sou suficiente”, “nunca vou ser feliz”, “a minha vida não passa disto”, … identificar e reconhecer filtros como estes pelos quais estimamos o nosso valor pessoal, mas igualmente a nossa eficácia para enfrentar novos desafios é fundamental para aliviar impactos desestabilizadores. Percebermos que as crenças psicológicas são convicções, ideias e perspetivas e não necessariamente realidade, muito menos factos, é determinante para nos diferenciarmos delas. Perdemos muitas vezes a noção disto.
As nossas crenças podem estender-se ainda à leitura de intenções e na confiabilidade dos outros (confiança interpessoal) – “não posso confiar em ninguém”, “este mundo está perdido”, “antigamente as pessoas eram diferentes”… não é difícil entender que este tipo de leitura afasta-nos do outro, isola-nos e limita-nos na construção de relacionamentos saudáveis. Crenças sobre grupos sociais, preconceitos e estereótipos, podem influenciar o nosso comportamento (direta e indiretamente) em relação a diferentes grupos de pessoas – crenças sobre a maior ou menor capacidade de género, de raças sobre outras, de nacionalidades sobre outras…
As experiências que vivemos, ou que herdamos, determinam muitas das nossas crenças que, por sua vez, desempenham um papel significativo nas emoções que experimentamos em resposta aos diferentes eventos e situações. Esta é uma das relações centrais nos processos de psicoterapia. Desenvolver uma maior consciência das crenças e automatismos do corpo subjacentes às nossas respostas pode reparar e cultivar alternativas mais adaptativas e construtivas, promovendo uma saúde psicológica mais equilibrada. Aceitarmos as nossas qualidades e imperfeições, através de um olhar compassivo sobre nós próprios e rodearmo-nos de pessoas que nos valorizam, apoiam e respeitam, aumenta a nossa confiança e capacidade de lidar connosco, e com os outros, de maneira mais positiva. As interações sociais ajudam-nos a reduzir a intensidade dos impactos emocionais, nomeadamente solidão e carência, mas também ansiedade e agitação. Quando é que nós enquanto agentes de autorregulação não somos suficientes?
Quando nos sentimos demasiadamente atropelados para agir ou reagir. Sabemos da elevada prevalência de perturbações psiquiátricas em Portugal, pelo que muitos dos sentimentos de desânimo e desesperança, ausência de interesse e prazer, baixa energia, dificuldades de concentração, distúrbios do sono, isolamento social, pensamentos ruminantes… que vamos relativizando e acomodando nas nossas vidas são, por vezes, condições médicas sérias, mas tratáveis, onde é aconselhável consultar um profissional de saúde para uma avaliação adequada e discussão sobre as opções de tratamento.
A vida vai trazendo, inevitavelmente, experiências dolorosas, com as quais podemos aprender muito e desenvolver habilidades emocionais; do mesmo modo, lembrar que também nos traz experiencias maravilhosas que vão enriquecer os nossos recursos internos. Vale sempre a pena cuidarmos de nós.
Vera Lisa Barroso, Pessoalmente ®
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